Em meu novo livro O Sutil Desequilíbrio do Estresse (Ed. Gaia) junto com o psiquiatra Dr. Sergio Klepacz e meu filho Lama Michel Rinpoche conversamos sobre como o acúmulo sutil de pequenas incoerências do nosso dia-a-dia acionam o eixo de estresse, causando sutis desequilíbrios na nossa química cerebral. Quanto maior for o conflito entre nossos desejos internos e as realidades externas maior será o dano que estaremos causando a nós mesmos!
Quão sábia foi minha filha aos oito anos de idade de me dizer: Só a gente que tá com a gente 24 horas por dia, sabe o que a gente passa. Afinal, aprendemos desde a tenra idade a representar um papel duplo, que atende simultaneamente aos comando do eu privado e do eu público.
De acordo com o neurobiólogo Dr. Daniel Siegel, por volta do nosso segundo ano de vida já aprendemos o truque de exibir expressões faciais afetivas diferentes dos nossos estados emocionais internos. (A mente em desenvolvimento Instituto Piaget, Lisboa). Muito cedo, aprendemos a agir de acordo com o que o mundo espera de nós!
Sem dúvida, quando nos comportamos socialmente de modo apropriado, garantimos nossa sobrevivência. Mas o ponto é que passamos tempo demais nos adequando socialmente sem nos darmos conta do que realmente está ocorrendo em nosso interior. Desta forma, sem a consciência de nossos sentimentos genuínos, não percebemos quando eles deixam de ser validados e expressados de modo coerente.
A experiência de expressar o nosso estado mental e de os outros perceberem e responderem a esses sinais é de vital importância para nossa saúde física e emocional. Tal coerência gera harmonia e bem-estar.
No entanto, são muitas as vezes em que sorrimos quando estamos tristes ou nos calamos quando queremos gritar. Representamos nosso papel social tão bem que nos surpreendemos com a habilidade de enganar o mundo à nossa volta. O fato é que ao cultivar o hábito de representar este papel duplo de modo incoerente criamos gradualmente cada vez mais vínculos artificiais.
Quanto mais artificiais nos tornamos, mais vulneráveis são nossos vínculos afetivos. Naturalmente, sempre desconfiamos do que intuitivamente não sentimos como verdadeiro. A artificialidade gera insegurança e desconforto. Inseguros, perdemos a capacidade de gerar vínculos autênticos, e, portanto, satisfatórios. Isso ocorre na medida em que perdemos a naturalidade em expressar nossos sentimentos tanto quanto a capacidade de ler os sinais genuínos das expressões afetivas alheias.
A questão é que o ponto de partida deste aprendizado deu-se quando ainda éramos bebês! Segundo o Dr. Daniel Siegel, a criança usa o estado de espírito de um progenitor para ajudar a organizar os seus próprios processos mentais. Ou seja, por meio das expressões faciais, do tom de sua voz e de seus gestos, os pais ensinam seus filhos a sentirem e expressarem suas emoções primárias.
Assim como as cores primárias são a base para a formação de outras cores, as emoções primárias geram a qualidade inicial de um estado emocional como agradável ou desagradável. Em outras palavras, se o humor de nossos pais influenciou nosso modo de pensar e sentir, precisamos agora, como adultos, sintonizarmo-nos com nossa própria natureza emocional.
O humor é o que dá um ponto de vista ao raciocínio. Se tivemos pais pessimistas e mal humorados é provável que tenhamos o hábito da desconfiar da possibilidade de que as coisas dão certo. Portanto, agora teremos que nos familiarizar com um estado de humor que seja mais favorável para nós. Na medida em que aprendemos a reconhecer a influência do estado de humor que cultivamos interiormente, podemos ajustá-lo de modo mais positivo.
Dr. Daniel Siegel ressalta: Aquele que não percebe seus sentimentos corre o risco de pensar de não tê-los. No entanto, isso não é verdade, os sentimentos estão lá, mas será preciso a consciência para acioná-los. Sentir nos orienta, ajuda-nos a planejar o futuro, a transformar nossos comportamentos destrutivos e a cultivar relações significativas.