segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Maneiras de acessar a espiritualidade


Texto escrito por José Tadeu Arantes

Nos últimos 30, 40 anos, uma sede de espiritualidade se instalou no planeta, fazendo com que muitos ateus convictos voltassem a suas religiões de origem ou fossem buscar em formas religiosas alternativas respostas a suas inquietações interiores. Contrariando Freud, que encarava a espiritualidade como um sintoma de imaturidade psíquica, pesquisadores respeitáveis, como o psiquiatra tcheco Stanislav Grof, garantem ser a dimensão espiritual uma instância fundamental da psique. Negá-la nos tornaria irreparavelmente mutilados. Segundo o médico Claudio Lottenberg, presidente do Hospital Israelita Albert Einstein, de São Paulo, 96% dos americanos acreditam em Deus e 90% rezam sistematicamente.

“Os que rezam fazem também por acreditar que suas preces têm um impacto sobre a saúde. Creio que esses dados podem ser estendidos ao Brasil”, afirma o médico. Mas, independentemente do motivo que a desencadeou, uma característica dessa nova espiritualidade é seu caráter ecumênico, menos preocupado em seguir o figurino de uma religião do que em combinar diferentes tradições. “Eu chamo essa tendência de bricolagem ou patchwork espiritual”, diz o pesquisador Frank Usarski, professor do programa de pós-graduação em ciência da religião da PUC de São Paulo.

“Ela leva em conta a liberdade do indivíduo na busca de seu caminho espiritual e está ligada à crise das instituições religiosas tradicionais. Explico: ioga, meditação, tarô, I Ching, carma, reincarnação etc. são práticas e conceitos cada vez mais usados de maneira isolada, sem nenhuma referência ao contexto histórico e sistemático em que originalmente surgiram.”É claro que essa tendência apresenta o risco da superficialidade, mas possui também um aspecto positivo, fazendo de cada um o sujeito de suas próprias escolhas.

Toda religião genuína nos traz uma parcela da verdade, adaptada ao tempo, ao lugar e às pessoas para as quais foi destinada. Por isso, as diferentes religiões não são excludentes, mas complementares. Jalal ud-Din Rumi (1207-1273), um grande místico e poeta sufi, declarou que existem tantos caminhos quanto caminhantes. Cabe ao indivíduo empreender sua própria viagem. Ligando o som para a música tocar sua alma, ficando quieto para ouvir o que há de mais profundo, observando a natureza ou indo para Santiago de Compostela.

No contraponto do som, a ausência deste também leva à abertura espiritual. A recitação musical dos sufis muçulmanos culmina no silêncio. A cabala judaica ensina que mais poderosa do que a prece pronunciada (constituída de sons articulados) e a prece mental (formada de pensamentos conscientes) é a prece silenciosa, realizada com a completa entrega ao divino.

Por meio do silêncio, o praticante alcança um estado de consciência superior ao da fala e ao do pensamento.

Silencia para que algo maior se expresse.

É a esse estado superior de consciência que alude o Salmo quando diz:

“Aquietaivos e sabei que eu sou Deus”. Na Índia, esse silêncio verbal e mental é chamado de Mauna Yoga. Sri Aurobindo Ghose (1872-1950), um dos maiores iogues da era contemporânea, explica o poder de tal prática:

“Quando o mental mergulha no silêncio é que, mais freqüentemente, se produz a completa descida de uma vasta paz, vinda do alto. E, nessa vasta tranqüilidade, dá-se a realização do Eu silencioso, situado acima do mental”.

Presentes em todas as religiões, eles são veículos que conduzem a Deus. A espiritualidade cristã afirma que, “no princípio, era o Verbo”, a palavra criadora de Deus. Também na espiritualidade indiana, o Aum ou Om, o Som Primordial, é considerado a primeira manifestação do divino.

Não se trata, é claro, do som articulado e audível, que necessita de um meio material para se propagar. Esse é apenas o quarto e último estágio do som. Aum ou Om é o primeiro. Não é a voz de Deus, mas a própria divindade em vibração. Pela repetição dessa sílaba, o iogue sintoniza sua consciência com o divino. Por isso, quase todos os mantras começam com Aum ou Om.

O emprego do som como um veículo para estados superiores de consciência está presente em todas as tradições espirituais autênticas. O xamã antigo tinha suas canções de poder, recebidas do plano espiritual ou transmitidas pelos sons da natureza (o pio da coruja, o farfalhar do pinheiro etc.). No candomblé afrobrasileiro, cada orixá é convidado a descer ao terreiro com um toque específico do atabaque. O emprego do som como um veículo para estados superiores de consciência está presente em todas as tradições espirituais autênticas. O xamã antigo tinha suas canções de poder, recebidas do plano espiritual ou transmitidas pelos sons da natureza (o pio da coruja, o farfalhar do pinheiro etc.).

E os padres do monte Atos, na Grécia, até hoje alcançam o transe místico sincronizando a recitação da frase Kyrie eleison (“Senhor, tende misericórdia”) com o ritmo respiratório. Procedimento semelhante é adotado por cabalistas judeus e sufis muçulmanos. Recuperando sua força original, que nossa ruidosa civilização esqueceu, a palavra evoca (lembra) e invoca (chama) a presença divina.

“Conhece-te a ti mesmo e conhecerás os mundos e os deuses.” Essa frase foi escrita na porta do Oráculo de Delfos, na antiga Grécia. Cada vez mais parte da vida, não estranha que o tema espiritualidade esteja presente no espaço terapêutico. Podemos começar uma sessão tristes, angustiados com problemas de relacionamento – em casa ou no trabalho – e sair com algo além de alento. Além de reflexão também. “As diferentes terapias têm como objetivo colocar o indivíduo em contato consigo mesmo.



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